quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Bodas de prata

Terminei "Profissionalismo é isso aí",tou agora analisando as canções que falam de casamento. É esta aqui é a primeira. E a mais antiga, também.



Bodas de prata
(João Bosco/Aldir Blanc)

Você fica deitada
De olhos arregalados
Ou andando no escuro de penhoar
Não adiantou nada
Cortar os cabelos e jogar no mar
Não adiantou nada o banho de ervas
Não adiantou nada o nome da outra
No pano vermelho
Pro anjo das trevas
Ele vai voltar tarde
Cheirando a cerveja,
Se atirar de sapato na cama vazia
E dormir na hora murmurando: Dora...
E você é Maria
Você fica deitada
Com medo do escuro
Ouvindo bater no ouvido
O coração descompassado
É o tempo, Maria, te comendo
Feito traça num vestido de noivado.

domingo, 8 de novembro de 2009

Paixão moçambicana






Esta semana andei ciscando nos livros, feito galinha desesperada. Comecei um, comecei outro, mas nada me agradava: enfiava de volta na prateleira. Sufocada pelo calor, estressada com exames médicos, queria algo que me desse TESÃO,poxa...

Ontem à tarde me deu na telha: vou ler o autor mais bonito do mundo, Mia Couto. Fui na estante, catei o primeiro, dos que ainda não tinha lido. Ah, era isso mesmo! Coimaxlinda, modeuzi!

A sinopse diz:
" Jesusalém, ermo encravado na savana, em Moçambique, abriga cinco almas apartadas das gentes e cidades do mundo. Ali, ensaiam um arremedo de vida - Silvestre e seus dois filhos, Mwanito e Ntunzi, mais o Tio Aproximado e o serviçal Zacaria. O passado para eles é pura negação recortada em torno da figura da mãe morta em circunstâncias misteriosas. E o futuro se afigura inexistente. Silvestre afança aos filhos e ao criado que o mundo acabou e que a mulher - qualquer mulher - é a desgraça dos homens. Mas um belo dia os donos do mundo voltarão para reivindicar a terra de Jesusalém. E não só isso - uma bela mulher também virá para agitar a inércia dos dias solitários daqueles homens."

Mas sinopses empobrecem, não falam da linguagem, do clima, do universo paralelo que se cria nas páginas que se vai abrindo,e nos puxam lá pra dentro, a compartilhar daquele mundo...

Mwanito é o narrador, o afinador de silêncios. É aquele que veio pra Jerusalém muito pequeno, não se lembra do mundo de lá, que, segundo o pai, morreu... Sua perspectiva é única, mas é curiosa, embora ainda não revoltada. A do irmão,porém, é pura revolta...

O pai brinca de ser Deus, e faz amor com a jumenta Jezibela, que corteja como se mulher fosse. E ela o trai com ...uma zebra.

Um dia aparece Maria, a portuguesa, e Jerusalém se torna o Eden, com adões que dão por falta de sua costela.

Mas no moçambicano Mia (diminutivo de Emílio) a linguagem é o grande achado. Se em Terra Sonâmbula, livro que fez seu renome, ele se mira no espelho da linguagem roseana, aqui ele é o dono dela. Mais que isso: é seu deus.

Cada capítulo tem epígrafe de grandes poetas mulheres da língua portuguesa: Sophia de Mello Brayner Andersen, Hilda Hilst, Adélia Prado (sintomático que duas sejam brasileiras? Não, Mia é declaradamente fã de nossos autores!)

Descobri que busco nos livros e nos autores justamente esse amálgama de enredo com linguagem própria e única, o prazer imenso de encontrar numa narrativa a criação de um universo que se diz com sua própria, adequada, inimitável linguagem.