terça-feira, 1 de setembro de 2009

uma crônica do Sérgio da Costa Ramos


(Sérgio compondo mesa com Sachet, na ACL, dia 27/8/09)



Para: Regina

De: Sérgio.

Bom proveito. Abraço.

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Crônica da crônica



Não há pergunta mais crônica no dia-a-dia de um cronista do que a pergunta “O que é uma crônica?”. Ora, a tentação é responder como Gertrude Stein, em sua famosa frase reticente: “Uma rosa é uma rosa é uma rosa”. É só colocar “crônica” no lugar de “rosa”.

Como, aliás, fez um dia Carlos Drummond de Andrade, dublê de poeta imortal e de cronista perecível. Fernando Sabino, mestre do gênero, defendia a descontraída senhora dos que insistiam em rotulá-la como uma espécie de literatura auxiliar.

Afinal, uma boa crônica tanto pode ter a brevidade da história curta, como a eternidade de um miniconto de Jorge Luís Borges. Depende da “idéia” e da “roupa” com que ela se apresenta.

No fundo, tudo começa com uma palavra, a primeira. A maior crônica que se conhece, começa assim: “No princípio, era o verbo”...

Claro, só o verbo não basta. Precisamos também do sujeito, do predicado, dos complementos. E de algum suor bíblico. Segundo o escritor e dicionarista inglês do século 18, Samuel Johnson, “o que é escrito sem esforço é lido sem prazer”.

Por isso, o escritor de crônica, poesia ou romance precisa sofrer um pouco. Mas precisa também se divertir um pouco. Ou escrever deixaria de ser um exercício de criação para se tornar um “cilício”. Aquele “castigo” que os fundamentalistas islâmicos até hoje se auto-infligem, chicoteando-se - ou o que é pior, chicoteando os leitores.

Menos dramático, o jornalista e escritor Sinclair Lewis, autor de pelo menos um grande romance (“Babbit”,1922), primeiro americano a ganhar um Nobel de Literatura em 1930, concedia:

- Escrever é simples. É a arte de sentar-se numa cadeira. E ali manter o rabo por meses.

Quer dizer: se o “assento” não produzir um bom “assunto”, pelo menos assegura ao escritor um belo broto de hemorróidas...

Crônica é o “descompromisso”é o coloquial literário, aquele recadinho que calha assim em 50 linhas. É um Lero-lero livre e “desinteresseiro”, embora se diga que o nosso primeiro cronista, Pero Vaz de Caminha, não tenha deixado de, logo na primeira “crônica”, pedir um favor ao Rei D. Manuel. Naquela carta em que o escrivão descreveu o encontro das culturas e até a “peladinha” das índias, achou um jeitinho de encaixar um pedido “nepotista”:

- Não poderia o senhor, Meu Rei, perdoar meu sobrinho Jorge Ozouro, que foi desterrado para a Guiné, por ter-se apropriado daquilo que próprio não lhe era?

O cronista morreu em Calicute, meses depois de ter enviado o apelo contido naquela que ficou historicamente conhecida como “a primeira carta”. Em homenagem “post-mortem”, D. Manuel, o Venturoso perdoou o sobrinho de Pero Vaz.

Até para isso a crônica já serviu. De habeas-corpus para o primeiro sobrinho beneficiado pelo Brasil recém-descoberto.

O primeiro caso de nepotismo explícito em “terras-papagalis”, muito antes dos netinhos de José Sarney.

4 comentários:

  1. oi, obrigado pelo convite para o blog secreto.
    também foi bom te ver.
    olha, aquela definição de escritor que vc colocou no começo do blog, segundo o Sergio Costa Ramos nessa cronica aqui é do Sinclair Lewis.
    abraços
    Rubens

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  2. Beleza, vou arrumar ali!
    Então foi por isso que não lembrei...É que primeiro ouvi o Sérgio FALAR isso...
    bj.

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  3. Só uma observação, o nome do livro de Sinclair Lewis é "Babbitt" e não "Bobbit"...

    Um detalhe apenas, mas se Deus está nos detalhes, na frase do arquiteto Mies Van Der Rohe, well, então estamos salvos...

    Abração do viking!

    Olsen Jr.

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  4. Só recortei e colei,mas já que os vikings anônimos notaram,vou corrigir.
    bj

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